Uma Nota Técnica do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) afirma que a Medida Provisória 905/2019, lançada pelo governo semana passada, promove um leque enorme de alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
“São nada menos que 135 dispositivos inseridos ou alterados na CLT. Ademais há a revogação de mais de 40 diapositivos da CLT hoje em vigor, ou em desuso.”
Isso é mais que a reforma trabalhista de 2017, no governo de Michel Temer, que modificou cerca de 100 pontos da CLT.
Esta é, na verdade, a reforma trabalhista do presidente Jair Bolsonaro, com mais privilégios para os empresários e prejuízos para os trabalhadores.
O presidente do Sindivigilantes do Sul, Loreni Dias, recomenda:
“Isso é muito importante e atinge a nossa categoria também, por isso peço que leiam essas explicações com atenção, até o fim, para compreenderem mais essas mudanças na legislação do trabalho, que são muito prejudiciais aos trabalhadores e trabalhadoras”.
Como toda Medida Provisória, essa tem validade por 60 dias e pode ser prorrogada por mais 60 dias. Durante esse período, ela já está em vigor mas precisa ser aprovada no Congresso Nacional e transformada em lei federal, para que seus efeitos continuem tendo validade após esse prazo.
Contrato Verde e Amarelo
O principal item da MP 905 é a criação do Contrato de Trabalho Verde e Amarelo.
Ele tem a finalidade, segundo o governo, de gerar empregos para jovens de 18 a 29 anos, com salários no valor máximo de um salário mínimo e meio (R$ 1.497,00).
Porém, na reforma trabalhista de dois anos atrás, com o apoio e o voto de Bolsonaro, prometeram dois milhões de empregos no primeiro ano, que nunca apareceram. Trabalhadores e trabalhadoras só tiveram prejuízos no bolso.
Para a professora de economia da USP, Leda Paulani, além de não gerar os empregos prometidos, as medidas da MP 905 podem tirar o emprego de quem tem mais direitos, os trabalhadores da carteira azul, apesar do governo dizer que os empresários não podem substituir os antigos funcionários pelos novos, que terão menos direitos.
“A carteira verde amarela é mais um golpe contra os direitos dos trabalhadores porque o empresário não vai querer contratar pela carteira azul com todos os encargos trabalhistas”.
De acordo com a professora e economista, o governo colocou ‘a faca e o queijo na mão’ dos empresários. Na relação de forças, de poder, quem perde é o trabalhador, afirma.
Para a economista, o governo usa a crise econômica para fazer reformas e retirar direitos. Ela ressalta que o Brasil atingiu o auge de emprego formal entre 2006 e 2011, quando a economia ia bem e o trabalhador tinha todos os direitos garantidos.
“A crise é usada para fazer reformas, tirar direitos. Esse argumento de que o desemprego está alto porque o empregador tem muitos encargos sociais é falso. A carteira verde amarela não vai gerar empregos”, afirma Leda Paulani.
FGTS menor
Com essa MP, os empresários receberam muitos privilégios, mas a conta disso vai sobrar para a classe trabalhadora.
Os jovens contratados via carteira verde e amarela receberão um valor menor do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) se forem demitidos sem justa causa.
“O § 2º do art. 6º reduz a multa do FGTS de 40% para 20% no caso de trabalhadores sob contrato Verde e Amarelo. Assim, essa multa, mesmo reduzida, revelando fraude à Constituição, tem o fim nefasto de baratear a demissão do trabalhador”, aponta a Nota Técnica do Diap.
O governo também extinguiu a multa adicional de 10% do FGTS que as empresas pagavam nessas demissões sem justa causa.
Além disso, os empregadores que adotarem o programa não precisarão pagar a contribuição patronal para o INSS de 20% sobre a folha, as alíquotas do Sistema S (Sebrae, Senai, Sesc, Sescoop, Sest, Senat e Senar ) e do salário-educação.
Com o Programa Verde e Amarelo, os empresários deixarão de pagar cerca de 34% em tributos.
Mas essa diminuição da arrecadação vai cair nas costas do trabalhador desempregado, pois o governo vai cobrar 7,5% do valor do seguro-desemprego para o INSS.
Com essa medida, o ministro da Economia, o banqueiro Paulo Guedes, espera arrecadar R$ 12 bilhões em cinco anos. Isto significa R$ 2 bilhões a mais do que custaria o seguro-desemprego, no mesmo período.
Ou seja, o governo vai arrecadar mais tirando dinheiro do trabalhador, num período de graves dificuldades financeiras, em que ele mais precisa desse dinheiro.
“Só posso chamar esta proposta de bisonha. O trabalhador já não tem renda porque perdeu o emprego e o governo quer arrecadar em cima dele, enquanto tira encargos dos empresários”, afirma Leda Paulani.
Redução do adicional de periculosidade
Outro ponto muito preocupante da MP, especialmente para os vigilantes, diz respeito ao pagamento do adicional de periculosidade, que vai diminuir de 30% para 5%.
O § 3º do artigo 15 reduz para 5% o adicional de periculosidade no caso do Contrato Verde e Amarelo, se o empregador contratar o seguro privado, mediante acordo escrito com o empregado.
Mas o percentual legal devido ao trabalhador é de 30%, conforme o artigo 193, §1º da CLT. Portanto, haverá uma redução remuneratória, caso seja contratado esse seguro, alerta o Diap.
Além disso, o § 4º do artigo 15 condiciona o pagamento de adicional de periculosidade à exposição ao risco por no mínimo 50% da jornada de trabalho.
O Diap critica essa exigência: “O trabalhador exposto a inflamáveis, explosivos ou energia elétrica, ou a roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial, pode, a qualquer momento em que esteja atuando, ser vítima de situação de risco.”
“A exigência de que esteja sujeito ao risco por 50% da jornada, assim, é um absurdo, além de contrária ao princípio da isonomia”.
A Nota Técnica ressalta ainda que não está claro, suficientemente, que essa redução se aplica somente aos contratos criados pela MP 905:
“Note-se que a norma não está dirigida expressamente ao Contrato Verde e Amarelo, embora esteja posicionada no conjunto de dispositivos a ele relativos, o que poderá levar à conclusão de que se trata de regra de aplicação a todos os casos, embora permaneça em vigor o artigo 193 da CLT.”
Portanto, ainda há duvidas sobre a abrangência da norma da periculosidade, se ela se aplica a todos os trabalhadores ou apenas aos jovens que forem contratados pelas regras da MP 905.
Aguardamos mais esclarecimentos.
Confira outras mudanças importantes provocadas pela MP Verde e Amarela:
– BANCÁRIOS: aumenta carga horária e libera trabalho aos sábados.
A MP do Emprego Verde e Amarelo altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) propondo o aumento da carga horária dos bancários e liberando o trabalho aos sábados.
A CLT determina que a duração normal do expediente bancário é de seis horas diárias, somando um total de 30 horas semanais e excetuando os sábados.
A MP do governo propõe que a carga extra só será computada a partir da oitava hora (exceto para quem trabalha somente em caixas, que continua com o limite de seis horas).
A jornada pode ser ainda mais se os bancários fizerem acordos individuais ou se for negociada na Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) ou Acordo Coletivo de Trabalho (ACT).
Em entrevista à Folha, a presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT ), Juvandia Moreira, disse que a categoria já havia marcado reunião para quinta-feira (14) com a Federação Nacional dos Bancos (Febraban) e vai discutir essas alterações que o governo propôs.
– COMERCIO E INDÚSTRIA – libera trabalho aos domingos.
A MP de Bolsonaro libera o trabalho aos domingos para o comércio e a indústria.
Os trabalhadores do comércio poderão descansar um domingo por mês.
Os da indústria descansarão um domingo por um mês e meio.
As empresas poderão usar a compensação em dia de semana, o que equivale para este efeito ao descanso semanal remunerado.
– GORJETA VIROU SALÁRIO
A MP autoriza os empresários a computarem as gorjetas como salário. Isso significa que os patrões poderão pagar o piso eao trabalhador e, se quiser ganhar mais, ele que corra atrás das gorjetas.
O § 5º da MP estabelece que, “desde que cobrada por mais de doze meses, esta (a gorjeta) se incorporará ao salário do empregado, tendo como base a média dos últimos doze meses, exceto se estabelecido de forma diversa em convenção ou acordo coletivo de trabalho”.
– REDUÇÃO DOS JUROS REFERENTES A CONDENAÇÕES TRABALHISTAS
A MP altera o índice de reajuste dos débitos trabalhistas que será com base no IPCA-E mais juros da poupança (em torno de 4,5% em 2018), o que pode estimular as empresas a apresentar recursos para adiar os pagamentos.
Isto porque, o cálculo da Justiça do Trabalho era feito com base no IPCA-E e juros de 12% ao ano.
– PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS
A MP de Bolsonaro libera as empresas a fecharem acordos de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) com uma comissão de empregados sem a participação de sindicatos, ao contrário do que determina a lei atualmente.
Prevê também a possibilidade da empresa fechar acordo individual de PLR com empregados que tenham formação superior e ganhem mais que o dobro do teto da Previdência Social [R$ 11.679,00].
E mais, hoje, o acordo que estabelece os critérios do pagamento precisa ser fechado antes do período ao qual a PLR faz referência. A MP determina que o acordo pode ser assinado em até 90 dias antes do depósito.
– TERMO DE AJUSTE DE CONDUTA
A MP permite o escalonamento como referência para punições aplicadas nos Termo de Ajuste de Conduta (TACs) firmados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) com empresas investigadas. Hoje, não existem limites para os valores.
A norma diz que as penalidades previstas nos TACs devem “ser atreladas aos valores das infrações contidas” na MP. O texto também limita a dois anos a validade dos termos, renováveis por mais dois, e acaba com multas milionárias pagas, por exemplo, por empresas condenadas por trabalho escravo.
– MULTA DE ATÉ R$ 100 MIL PARA ASSOCIADOS A SINDICATOS
A MP cria multa de R$ 1 mil a R$ 100 mil para os associados de sindicatos que deixarem de votar nas eleições sindicais sem justificativa.
É importante ressaltasr que isso não foi discutido com os sindicatos, as entidades sindicais nunca solicitaram essa medida.
A MP Também atualiza o valor da multa para as empresas que recolhem a contribuição sindical de seus funcionários, mas atrasam ou deixam de repassar aos sindicatos, ou que impedem o trabalhador de se sindicalizar.
Na CLT, a multa estava em cruzeiros.
Essa multa também variará de R$ 1 mil a R$ 100 mil, dependendo do porte econômico ou gravidade da infração.
– MP TIRA EXCLUSIVIDADE DO BB E DA CAIXA
A MP 905, ou Programa Verde e Amarelo abre espaço para os bancos privados pagarem seguro-desemprego e abono salarial, que até agora era exclusividade da Caixa e do Banco do Brasil.
Fontes: Agência Brasil/Diap/Dieese/CUT/Palácio do Planalto
(Texto modificado às 17h50 para acréscimo da informação sobre o prazo da Medida Provisória)